Uma viagem a trabalho marcou a vida não apenas do jovem Túlio Janez e sim de muitas famílias que estavam hospedadas em um hotel em Natal, no Rio Grande do Norte.
Túlio é de Itapetininga e foi escalado para viajar sozinho e trabalhar na produção de um show. Lá foi ele. Embarcou com suas malas no aeroporto e logo já estava instalado no quarto.
Bateu a canseira e resolveu tomar um banho antes de dormir. Ao se deitar, percebeu que a carga do tablet estava no fim. Procurou o carregador e ao colocá-lo na tomada, o estouro. Isso mesmo. Explodiu. No mesmo instante, as luzes do quarto e de metade do hotel, aproximadamente 20 quartos, o que equivalente a dois andares, sofreram a queda de energia.
Corre-corre danado até que a vistoria fosse feita no quarto. Como a energia foi desligada do prédio, o carregador foi retirado da tomada e ninguém sofreu acidente. Ufa, alívio de um lado mas de outro, um caos se formou no hotel. A energia na parte afetada só foi retomada no dia seguinte. A concessionária de energia da cidade foi acionada para trocar um transformador de um poste.
“Foi constrangedor ficar na escuridão e muitas famílias também enfrentaram a mesma situação. Desde esse dia, passei a prestar mais atenção nos carregadores. Nunca tinha passado pela minha cabeça que poderia estourar e muito menos, causar o dano para parte de um hotel. Saí ileso e sempre conto essa história para que sirva de alerta para as pessoas, tanto que mostro como ficou o fio depois do estouro”, comentou Túlio.
Quais os motivos que causam esse tipo de estouro com carregador de aparelho eletrônico?
Para entender deste assunto, fomos ouvir um especialista na área de engenharia elétrica. Eduardo da Silva Costa atua na área há 32 anos e está acostumado a explicar para alunos e funcionários de empresas situações comuns e graves. “Infelizmente as mortes ocorrem de forma que não esperamos como atuantes na área. A informação está aí e é preciso cuidado e atenção por parte das pessoas. Um simples cuidado com as instalação elétrica, evitando inúmeros acidentes”, frisou.
Ele iniciou o bate-papo com uma pergunta. Você sabe a importância de um DR? No mesmo momento, respondi. Só conheço DR como Discutir Relação (risos), mas na verdade, nem sei e nem para que serve esse equipamento. Prontamente, ele explicou que trata-se que todas as instalações prediais, industriais e residenciais deveriam ter. É um “Dispositivo Residual” que custa barato e custa a vida. “A função desse aparelhinho é detectar pequenas fugas de corrente em curtos circuitos, acionando imediatamente o desligamento e com isso evitando que ocorram acidentes”, disse.
Com relação ao ocorrido com o Túlio no hotel, no Rio Grande do Norte, o especialista Eduardo da Silva Costa esclareceu que primeiramente, deve ter ocorrido o curto circuito no fio do carregador. “Com certeza, o fio já apresentava problema e ele nem tinha percebido”.
Após colocado na tomada o carregador, e ao movimentar o fio para ligar o seu tablet em carga com o denominado carregador, teve a surpresa de presenciar um curto circuito, vindo a queimar toda a fiação, e numa fração de segundos percebeu o desligamento de parte do hotel onde se hospedava.
Explicando melhor o ocorrido, destacou que tal situação de um desligamento maior ocorreu, pela falta de atuação do disjuntor daquele circuito a montante, ou seja, por se tratar de um valor muito baixo de curto circuito e não se tratar de uma sobrecarga. Não houve atuação do disjuntor do quarto que serviria para desligar o curto circuito, sendo que tal perturbação sensibilizou o disjuntor geral daquele setor refletindo a no desligamento do disjuntor a montante como se fosse uma sobrecarga, dado o horário do ocorrido ter coincidido com horário de pico da utilização de energia suprida no hotel (ou seja falha na seletividade dos equipamentos de proteção).
Chegou-se então a conclusão que a sobrecarga gerada pelo curto circuito no carregador de baterias não atuasse para desligar o disjuntor do quarto em especifico e sim a do disjuntor geral de parte do hotel, ou seja, apesar de ser uma corrente pequena de curto, foi somada a corrente onde estava sendo utilizada por parte do prédio ocasionando o desligamento por sobrecarga, ou falha de seletividade, que nada mais é do que a sobreposição de curvas de atuação e tempo.
“Sempre temos que estar atentos a uma questão. Quanto maior for o valor do curto circuito, menor será o tempo de atuação. A multiplicação da tensão de linha pela corrente dissipada, representa a potência”, completou o especialista.
Eduardo contou que as pessoas devem verificar se todos os equipamentos estão de acordo com o NBR 5410:2004 e antes de encerrar a explicação e passar alguns conselhos ao leitor, Eduardo fez duas perguntas como reflexão que serve para qualquer pessoa. Quando se fala em eletricidade, quanto custa um DR (Dispositivo Residual de Proteção)? E quanto custa um funeral?
Alerta do especialista:
Nunca puxe o carregador pelo fio;
Não use o aparelho celular ou qualquer outro equipamento enquanto está recebendo carga;
Evite a compra de imitações ou itens clandestinos;
Evite expor ao calor ou ao sol;
Não deixe celular na cama.
O cabo do carregador pode sofrer aquecimento. Estar atento se há produção de faíscas. Caso estas entrem em contato com material inflamável, poderá gerar um incêndio de grandes proporções.
Incêndios por sobrecarga aumentam em 100%
O mais recente levantamento do Anuário Estatístico de Acidentes de Origem Elétrica 2019 – ano base 2018, da Abracopel – Associação Brasileira de Conscientização para os Perigos da Eletricidade mostra que em 2018, morreram 61 pessoas, vítimas de incêndio por sobrecarga de energia. Em 2017, foram 30.
Em 2018, foram registrados 1.424 acidentes com origem elétrica em todo o país, sendo 836 choques, 537 incêndios por sobrecarga ou curto-circuito e 51 descargas atmosféricas (raios). Isso representou um aumento de 2,67% em comparação ao ano anterior e de 37,2% em relação a 2013, início da série histórica.
O documento representa um autêntico e legítimo levantamento estatístico dos acidentes – com e sem morte, que acontecem no Brasil. Segmentado por tipo de ocorrência – choque elétrico, incêndio gerado por sobrecarga ou descarga atmosférica (raio), e também por gênero, faixa etária, profissão, atividade, localidade, dentre outros, o Anuário mostra com a frieza dos números que, a cada dia, duas pessoas morrem em acidentes cuja origem é a eletricidade.
Com o Anuário da Abracopel, os dados são usados, não somente pelas mídias nacionais para traçar um cenário das instalações elétricas brasileiras, como também por profissionais do setor, entidades afins que usam nossos dados para traçar estratégias de ação em lançamentos de produtos e serviços.
Abracopel
São 14 anos de existência. E há 14 anos, a Abracopel - Associação Brasileira de Conscientização para os Perigos da Eletricidade caminha na direção de um Brasil com instalações elétricas mais seguras. Um Brasil em que não necessite fechar estatísticas compondo quase duas mortes por dia causadas por choques elétricos.
A missão da Abracopel sempre foi clara e límpida: conscientizar a população brasileira sobre os riscos (que ela mesma corre) que a eletricidade oferece quando não é devidamente respeitada.
De acordo com o engenheiro eletricista e diretor executivo da Abracopel, Edson Martinho, essa conscientização tem sido feita incansavelmente. “Ações são pensadas e implementadas todos os anos, na busca pela diminuição dos acidentes de origem elétrica. Buscamos atingir profissionais, crianças, adolescentes, donas de casas, jornalistas, professores, alunos, eu e você”, frisou Edson Martinho.
Ainda segundo ele, busca-se apoio financeiro com as empresas de maior credibilidade do setor elétrico. Não são aceitados recursos de empresas que não tenham compromisso com a segurança. “Esta atitude da Abracopel, ao mesmo tempo em que nos trouxe uma credibilidade invejável, também nos limitou financeiramente. E a cada ano, temos que ir até estas empresas e mostrar – de novo e de novo – a importância de nossa luta. E como elas, empresas, se beneficiam, em lutar ao nosso lado”, disse.
“As tecnologias estão surgindo quase que diariamente e a maioria depende de energia elétrica, entretanto não há nenhuma preocupação com a infraestrutura elétrica, ou seja, as pessoas não sabem que as instalações são "limitadas" e que devem ser corretamente dimensionadas para suportar tanta carga elétrica. Com isso vão inserindo equipamentos nas tomadas, aumentando as tomadas por dispositivos como "benjamins, TEs e extensões", mas não avaliam que quanto mais equipamentos, mais quente ficam os fios até chegar o ponto de sobreaquecimento e incêndio. Por outro lado, equipamentos que utilizam baterias, requerem vários cuidados, um deles é com a qualidade e procedência, o outro é com a necessidade de não utilizar o equipamento quando estiver ligado para carregar, pois não foi preparado para isso e pode levar a acidentes”, enfatizou o diretor executivo da Abracopel, Edson Martinho.
ITAPETININGA